Tem uma pessoa que não podemos esquecer quando se quer contar a história da Fazenda Tamanduá: Didier Jean, pessoa discreta, mas que teve uma atuação muito importante.
Em 1976, decidi adquirir uma Fazenda no sertão nordestino para produzir algodão mocó de fibra longa, seguindo as orientações do pesquisador francês do IRCT Jacques Boulanger, que trabalhava na SUDENE, na elaboração e melhoramento genético, e pai do C71.
Fui ver de perto qual era o sistema de produção praticado. Praticava-se o famoso binômio gado/algodão.
Apaixonado pela cultura do algodão, eu não tinha muitos conhecimentos sobre as técnicas de gestão e reprodução do gado.
O meu amigo Didier Jean, arquiteto parisiense, achou este desafio às alturas das capacidades dele. Ele se formou em “Conduite de troupeau”, inseminação artificial, bem como efetuou um estágio no INRA, organismo de pesquisa francês irmão da EMBRAPA, para aprender a técnica inovadora da transferência de embriões por via cervical, sem intervenção cirúrgica então.
Cheguei de São Paulo em abril 1977 na Fazenda Tamanduá, falando bem o português, e comecei a organizar as coisas, principalmente indicando aos moradores que íamos abandonar o sistema de “meia” para assalariar todos os colaboradores, dando-lhes mais segurança econômica.
Comecei a conversar com a Secretaria de Agricultura da Paraíba, preparando a Fazenda Tamanduá a se tornar produtora de sementes selecionadas de C71, o que foi até 1984. Cooperação frutuosa e que me ensinou muito.
O gado leiteiro da Fazenda comportava umas dúzias de vacas lideradas por Araruta, Carapeta, Schwitinha, que deixou 15 crias em casa, oe touro Givanildo, de raça “schwitz”, mas que tinha sofrido da aftosa e era bem feio, mas bem disposto e com crias razoáveis.
Em julho 1977 chegou Didier, o salvador do rebanho trazendo conhecimentos ideais e recentes para organizar e redimensionar este rebanho de maneira eficiente e produtiva. Belo desafio que ele encarou com coragem e garra.
Optamos pela raça Parda Suíça, já bem estabelecida no Nordeste, e a inseminação artificial que podia trazer uma melhoria rápida da qualidade dos animais.
O único problema é que ele não falava uma palavra de português e mesmo com vaqueiros muito interessados pelos conhecimentos dele, não foi fácil pelo menos inicialmente.
Além do mais, resolvi deixar a fazenda por um tempinho para tentar convencer Catherine, a minha futura esposa, a conhecer a Fazenda onde eu ia viver doravante.
Didier ficou sozinho!
Amigo de longa data, de total confiança, avançamos juntos nessa bela aventura que é a Fazenda Tamanduá.
Um passo importante foi de valorizar o leite, até então vendido a leiteiros da cidade de Patos que vinham diariamente de moto o buscar, com tambores contendo já água e até piabinhas...
Montamos a queijeira, com SIF, produzindo queijos locais como o coalho, mas também de tipo europeus, maturados como o tipo Saint Paulin e o Reblochon.
Efetuamos a primeira transferência de embriões por via cervical do Brasil.
Importamos novilhas prenhas da Suíça.
Participamos de feiras em Parnamirim e Recife, arrebanhando prêmios, divulgando a nossa raça e vendendo os nossos animais.
No fim do ciclo do algodão, resolvemos implantar a área de mangas irrigadas.
Uma força excepcional que Didier possuía era a sua calma. Devido ao fato de ter uma certa visibilidade na região e de ser estrangeiro, todas as inspeções, fiscalizações acabavam aqui, e se perdia um tempo imenso para explicar e demostrar a nossa boa-fé. Didier que se dizia “inemmerdable”, aguentava a pressão com tranquilidade.
Graças a sua presença tivemos, Catherine e eu, a oportunidade de acompanhar o crescimento dos nossos 3 filhos, inicialmente na própria Fazenda com os cursos da Educação Nacional francesa, viajando também de veleiro no mundo. Depois nos internatos e universidades da Europa, podendo nos ausentar com tranquilidade, deixando sempre a Fazenda Tamanduá em boas mãos.
Devagar a Fazenda se estruturou cada vez mais, e Didier e eu envelhecendo... O nosso papel de pessoas super ativas minguou, passando a supervisão e estratégia.
Didier afastou-se, indo para o litoral, perto do mar que ama, e eu para a Europa, mais perto da família, mas o nosso coração continua palpitando para a Fazenda Tamanduá e os seus passos.
Muito obrigado Didier!